um rosto.

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...quando dei por mim, todos riam menos eu.


Foi tudo muito rápido. Apenas a imagem do teatro me atraia a atenção: os risos, os olhares, os cochichos. Mas, para surpresa minha, vi ao meu lado outra pessoa que também não ria e parecia tão atordoada quanto eu. Um rosto lânguido olhava para um ponto perdido no horizonte como se nada a seu redor tivesse existência ou sentido. Seus olhos transmitiam um ar de serenidade que, por instantes, se assemelhava à tristeza; apenas por instantes, como se esse fosse seu segundo significado.


Sacudi a cabeça, como que para espantar esse segundo pensamento e a imagem daquela jovem e tratei de retirar-me dali. A peça havia acabado e pelo pouco que recordo da apresentação, vi que de nada me adiantou a tarde.


Voltava agora para minha casa com um pouco mais de pressa, pois o tempo, ora triste, dava mostras de que a noite seria chuvosa. Assim, alarguei os passos e não me detive em nenhum dos locais onde habitualmente converso com um ou outro conhecido.


No entanto, o retorno pareceu mais longínquo em decorrência dos muitos pensamentos que permeavam minha cabeça: o primeiro deles referia-se ao que tinha feito durante a apresentação para de nada poder lembrar-me; o segundo trazia-me à memória aquele rosto. Mas por que aquela jovem também não ria? Por que aquele rosto me atraiu tanto a atenção? Não era de beleza extraordinária, não trazia consigo vestes exuberantes, muito pelo contrário, vestia-se de modo simples, como pude ver com mais detalhes ao sair. Mais uma vez sacudi a cabeça, como que para rejeitar esses pensamentos e voltei, quando não às primeiras reflexões, ao menos ao trajeto que deveria fazer até minha casa.


Cheguei. Como era de se esperar, chovia muito durante a noite. Cansado como estava, não hesitei em dormir um pouco mais cedo. Tomei um banho quente, adiantei o jantar, li algo para que o sono chegasse mais violentamente e entreguei-me aos braços de Morpheu, como diria minha avó.
Acordei de sobressalto, com o dia já posto e o sol raiando por entre as persianas de meu quarto. Eram exatamente nove horas da manhã e eu ainda estava em roupas de dormir. Desci, vestido da mesma forma, e peguei o jornal, lançado à minha porta provavelmente há três horas. Senti o chão ruir aos meus pés quando vi, na primeira página, aquele mesmo rosto da tarde anterior e, em letras garrafais, a seguinte frase: Suicida-se Inês Lustosa Allevato*.


Este nome não faz referência a qualquer pessoa real, servindo apenas à liberdade artística para ficção.

Comentários

Você está um contista de mão cheia mocinho!!
Muito boa a continuação!Adoreeeei, acho até q sou suspeita pra falar...Gostei da forma de escritaa demais, mas fiquei triste, ansiava por ver aí um enlance amoroso entre a jovem de rosto marcante e o rapaz. Que peninha...Ando querendo voltar a crer em romances...ahaha.
Beijooe sucesso literário sempree!!
Keu Azevedo disse…
A-D-O-R-E-I
tem estilo, é envolvente...

Quem é esta criatura?!

#tensa. o.Õ

Mais contos...Please?
(=
Daniel Savio disse…
Sabe o que é pior, não é em si a semelhança entre as nossas vidas, mas sim que poderiamos seguir o caminho de ruína...

Fique com Deus, menino "Caro Cidadão".
Um abraço.
Fabio Moreira disse…
Rapa!!! Se eu não tivesse sobrio iria disser que esse conto foi estraido de algum livro de Machado de Assis...Dom Casmurro...não sei por que mim lembrou o livro...
Até mitologia o homi ta usando no texto..quanta maturação...hehehehe

Bom conto!!!
P.s.: Sei pq tu não lembra da peça... ¬¬ -- srsrsrsrs

Teatro quanta saudade!!!
Táxi Pluvioso disse…
Conclusão: não se deve ler jornais. bfds
Braulio Pereira disse…
adorei estar aqui com voce

voltei de Portugal



beijos flor!!!
Um caro cidadão disse…
Fico sem jeito com os comentários... XD



Fábio, de fato o teatro não sai de mim. Fase boa de minha vida.


Ana e Keu, muito OBRIGADO, mesmo pelo comentários.


Não pensei que fosse sair tão bem o texto.



Abraço forte em tod@s vocês!
Keu Azevedo disse…
Eu li duas vezes e nem sei o que comentar...
Minha cabeça tá girando, meus pés querem voar...

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